Respondeu-lhe que sim. “Mas a sério que estás bem?”. Sempre mentiu muito bem sobre esta questão. É uma merda. É uma merda, porque fica a porcaria dos olhos à mostra, e os olhos, esses cabrões não mentem. Esses filhos da puta, não mentem nunca. E ele sabia tão bem que ela não estava bem. Mas ela respondeu-lhe que sim. E ele fingiu. Fingiu tão bem como ela. Fingiu que acreditou. E ela fingiu que estava bem. E assim ficou tudo bem. Até não ficar, porque a merda vem sempre à tona. E quando se gosta de alguém não se consegue ignorar por muito tempo a verdade que se vê nos olhos dela quando ela mente. E ele correu, para lhe mostrar que estava lá. Que ela podia dizer a verdade, ela podia despejar a carga de água que lhe carrega nos olhos, que ele tinha chapéu de chuva para lhe emprestar. E galochas. Para os dois. E abraçou-a. Ela estava fria. Gelada até.
Ela. Ela perdeu as forças e afundou-se nela própria, afogou-se na mentira da verdade que não contou. E quando ele veio em seu resgate, ela já se tinha afundado, e nem os cabelos longos a salvaram. Porque ele, quando a alcançou os cabelos escorregavam-lhe das mãos, assim como ela.
E ele atirou-se de cabeça para o mar que ela se transformou. E afundou. Afundaram os dois. Perderam-se os dois. Era uma resposta tão simples. “Tás bem?”, “Não, salva-me.” Parece tão simples agora.
Hoje. Ela é outra.
Hoje. Ele é outro.
Hoje são outros na vida de alguém. Resgataram-se da sua própria vida, mas primeiro tiveram de morrer. E como imagem de marca para o futuro e para os outros próximos, tatuaram no corpo “this too shall pass”. E sim. Tudo passou. Tudo passa. Tudo passará.
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